terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Eu gosto de gente assim
e tenho medo.
Eu corro de gente assim
não é segredo.
Eu chamo por gente assim
e, às vezes, cedo,
manheço com gente assim.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Mágico chinês (Ao poeta Rubens Rodrigues Torres Filho)

Até os bofes acabaram
até as bibas penduraram as chuteiras
Até os bobos debandaram
até os loucos se cansaram das bandeiras.

Até as pulgas se mataram
e os cinemas se fecharam para os dramas
E os cantores se calaram
canções sem dono criam asas e escamas -.

Até os peixes se afogaram
como se tudo começasse outra vez.
E no silêncio da avenida, um bar, de porre:
Abra! Bradava, feito um mágico chinês.

sábado, 24 de janeiro de 2009

Sutilezas (para o Márcio Garcês)
Todos são
todavia não.
Sutilezas sim
pensamentos sim
pensamentos não.

Todos não
toda a vida sim
feito um circo assim
de palhaços não
de palhaços sim.

Todos são!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

O pio da coruja (Para o Pio Vargas)

Assim na terra como no seu
no meu desejo de amigo
o nosso amor virando manha.

Assim nos olhos como no sexo
o meu desejo é um perigo
o nosso amor virando manhã.

No seu espaço a gente dorme
no meu, estrelas amanhecem
o nosso hotel de todo dia.

Assim no sol como na terra
o nosso amor é uma barra
a nossa farra e ferrovia.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Andava meio só
ligado em canções subversivas
perdido em meu urbano
meu humano
meu amigo
a vida, vez em quando, dá um nó
nos gritos de loucura e de perigo.

Andei meio anormal
perdido em funções subjetivas
um raro animal em sua jaula
é só saudades
dos tempos de andar solto nas florestas
dos índios nus e bichos da floresta.

Andei meio sem sal
odiando pessoas, sem sentido
querer viver é tudo: bem e mal
querer morrer é o medo do inimigo.
Meu tempo agora é um som hard core
meu trash metal já morou contigo.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Em novembro de 1979, meu primeiro filho se preparava pra nascer.
Um problema de última hora e ele nasceu morto, frustrando tudo que eu, minha esposa e familiares havíamos sonhado.
Pedro, era o nome do moleque.
No atestado de óbito, em vez do nome, colocaram “nati-morto”.
Naquela noite, ainda no hospital, escrevi textos duros, doídos, pra tentar escapar da morte do meu Pedro, pra escapar do choro, pra escapar da mágoa. Em vão.
No outro dia, pela manhã, fiz questão de ir ao Cemitério Parque de Goiânia, cuidar do enterro.
Hoje, 15 de janeiro de 2009, 30 anos depois, eu encontrei os textos que escrevi no hospital.
Sim, meu Pedro, se estivesse vivo, faria 30 anos.
Um envelope amarelado saltou hoje, na minha frente, do nada, na estante da minha sala de trabalho.
São textos duros. Li e chorei como se tudo fosse agora.
Publico cinco textos aqui no meu blog, não como uma coisa mórbida.
Nada disso, embora possa parecer.
Publico como homenagem ao meu filho Pedro, no ano em que ele completaria 30 anos.
Publico como se eu falasse “tô com saudades”, como se dissesse “eu te amo pra sempre”.

Texto 1
Não foi possível que a gente se conhecesse
não foi possível que a gente ficasse amigos
não foi possível que a gente se abraçasse
se entendesse, se gostasse e se dissesse: eu te amo!

Não foi possível que a gente se oferecesse
Não foi possível que a gente se namorasse
Não foi possível que a gente se encontrasse
olhos nos olhos, se olhasse
e se dissesse: eu te amo!

Não foi possível que a gente se beijasse
com todo amor que a gente beija quem se ama
Só foi possível que a gente se despedisse
se desse adeus e chorasse
e nem dissesse: eu te amo!


Texto 2
Aquário,
faltou água pro seu peixe
faltou fôlego, aquário
faltou ar e faltou água.

Seu peixe ficou só no rio seco,
entre as paredes de vidro
quis se debater, aquário
pediu água e lhe faltou.

Quem dera, não faltasse nunca água
pra esses peixes de aquário.
Quem dera eu fosse falsário
pra reinventar a vida
desses peixes sem aquário.


Texto 3
Taí, tô só, seu moleque,
do jeito que eu não queria.
Que a gente lhe esperava...
... também ficou só, Maria.

Taí, tô só, sem palavras,
de tanta mágoa, de tanta
coisa mal feita e imposta,
de tanto nó na garganta.

Pois é, moleque, e agora?
Você pôs o pé na estrada
e a gente ficou sem dono
e a gente ficou sem nada.

Tô magoado, moleque,
tô carregado de mágoa,
tô feito você na bolsa:
sozinho, sem ar, sem água.


Texto 4
Vida sobre pedras,
sobre águas, sobre rios,
sobre serras, sobre corpos,
sobre todos, sobre tudo:
Pedro!

Riso sobre bocas,
sobre olhos, sobre rostos,
sobre passos, sobre cantos,
sobretudo sobre sonhos:
Pedro!!

Hoje, sobressalto,
sob horas, sob choros
sob medos, sob caras,
sob gritos, sob mágoas,
sobre pedras, sob terra:
Pedro!!!


Texto 5
Nati-morto, te chamaram.
Mas eu te chamo de Pedro
Mas eu te chamo de filho
Mas eu te chamo de meu.

Nati-morto ou nati-merda
não dizem a mágoa da gente
não pagam o sonho daquilo
que um dia se quis semente.